Respeito aos concorrentes, adversários e também aos inimigos

Uma coisa que o jogador de futebol aprende bem cedo — pelo menos precisa aprender para passar uma imagem positiva para o público — é declarar, quando entrevistado, seu respeito irrestrito pelos adversários. Aí, não raro, ouvimos coisas mais ou menos assim:

— Estamos aqui para mais uma partida contra um adversário valoroso — o adversário é muito ruim, mas ele não diz — e espero dar tudo de mim para obtermos mais essa vitória para nossa equipe, o que é importante.

Para completar a entrevista ele sempre diz que está com 90% da sua capacidade física — ninguém sabe como ele chega a este percentual, mas ele diz — , depois arranja um jeitinho para usar a expressão “sem dúvida” — jogador de futebol adora responder uma pergunta começando por “sem dúvida” — , elogia a galera, faz o sinal da cruz e sai correndo até o meio do campo. Bem, apesar das mesmices e dos tropeços no vernáculo, uma coisa positiva fica para o ouvinte: ele respeita os adversários.

Entendendo as diferenças

É preciso, antes de mais nada, que se entenda corretamente a diferença entre concorrente, adversário e inimigo.

— Concorrente é aquela pessoa que disputa com você o último pedaço de pizza que ficou na bandeja;

— Adversário é o que come logo esse último pedaço sem considerar que você também está a fim de comê-la;

— Já o Inimigo é aquele que prefere jogar fora o último pedaço, mesmo estando com fome, só para não admitir a possibilidade de que você venha a comê-la.

O relacionamento entre concorrentes deve ser sempre ético. Embora defendam os próprios interesses, fazem-no respeitando princípios e normas aceitas e praticadas por todos. Nada impede, até mesmo, o relacionamento fraterno entre eles. Seus interesses em primeiro lugar, sim, porém dentro da regra do jogo.

Já o relacionamento entre adversários é um pouco diferente. Estes, normalmente, deixam a ética na gaveta ou usam-na só parcialmente. Admitem que todo jogo tem regras mas que regras existem para serem mudadas. Principalmente se for para atender os próprios interesses.

Com os inimigos a coisa é bem diferente; ética é um conceito inexistente. E tem mais: se não “der” pra mim, não vai “dar” pra ele também. O inimigo pensa primeiro na derrota alheia e só depois na própria vitória. Assim, sua maior satisfação é ver a falência do outro mesmo que depois venha a sua. Não faz mal; o outro se deu mal primeiro.

De certa forma, não há mistérios para se identificar quem é um e quem é outro neste jogo. As primeiras jogadas sempre definem o caráter do jogador e a experiência de vida ajuda bastante nessas horas. Na dúvida, ponha uma pizza na mesa e veja a reação dele.

As exigências do mundo moderno impuseram ao empresariado uma reflexão mais profunda a respeito do assunto. Antes, simples concorrentes eram vistos como inimigos e, tomados por esta visão, muitos dirigiam suas estratégias muito mais para derrotar o outro do que, propriamente, para vencer. E isto começou a ser refletir nos números.

Como se diz no mundo dos negócios, “contra cifrões não há argumentos”. E logo alguém descobriu que pelejar contra o inimigo custava mais do que conviver pacificamente com ele. Os números mostravam isso.

A solução então foi criar regras, como um armistício; deixariam de lutar um contra o outro e concentrariam suas forças na direção do mercado. A ideia vingou é hoje largamente disseminada através das cooperativas, associações, clubes e federações que representam os mais diversos segmentos empresariais da sociedade. Tais instituições existem, justamente, para cumprir este propósito e, por isso mesmo são fundamentais dentro do modelo atual de negócios.

Ninguém pode mais, até mesmo por uma questão de lógica, dirigir sua estratégia contra o “inimigo” ao invés de concentrar suas forças, por exemplo, na captação de novos clientes.

A paz, mesmo condicionada, é sempre menos onerosa do que a guerra.

Quando se fala em “planejamento estratégico”, é conveniência prioritária estabelecer uma política de relações com a concorrência. Os concorrentes são vetores do nosso negócio. As ações deles interferem diretamente nas nossas e podem até decidir o nosso futuro. Manter uma política saudável com eles, fundamentada em compliance, códigos de condutas e princípios éticos, é atitude sensata de quem quer resguardar os próprios interesses.

Napoleão Bonaparte, sempre que desconfiava de um assessor direto, um ministro ou de alguém intimamente ligado ao poder, trazia-se para perto de si, diferentemente de outros governantes que costumavam desterrar seus desafetos. Ele costumava dizer que “lugar de inimigo é ao meu lado”. Atitude sábia do imperador francês. Com o “traidor” por perto é muito mais fácil conter a traição.

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