Os caminhos do ensino superior no Brasil

Após muitos anos atuando na gestão de instituições do ensino superior, estou absolutamente convencido de que o verdadeiro cliente delas é a sociedade. Suas atividades principais: ensino, pesquisa e extensão a ela se destinam, tornando-a melhor. A sociedade se beneficia das novas formas de resolver seus problemas que a pesquisa proporciona, de profissionais mais qualificados por elas formados e participa interagindo nas suas atividades de extensão recebendo ajuda e proporcionando a prática aos alunos. Alunos, na verdade, são um dos produtos dessas organizações de ensino.

É obvio que, principalmente nas instituições particulares, são os alunos que respondem pela maior parte das receitas e que elas precisam ter resultados financeiros positivos e nos casos das com fins lucrativos, gerarem lucros para remunerar o capital.

Temos visto no Brasil um mercado do ensino superior aquecido e com um grau de competição maior e maior. Grandes grupos são “players” cada vez mais dominantes, mas concorrem com organizações de médio e pequeno porte, que na maioria das vezes não conseguem identificar seus nichos de mercado. Aquisições e incorporações de instituições são constantes e o oferecimento de vagas já supera em muito a demanda, o que justifica absorver concorrentes e não colocar novas vagas. A maioria dos cursos já tem grande ociosidade, gerando grandes prejuízos. Existia um curso que fugia dessa lógica, com baixíssima ociosidade, mas com as recentes autorizações do MEC de novas instituições já mostra um aumento de vagas não preenchidas. Espera-se que a quantidade de vagas seja compatível com a capacidade instalada para oferecê-las, o que representa o custo operacional da organização, portanto, quando ociosas, diminuem o resultado esperado e consequentemente o lucro.

Então, o que estão fazendo os gestores?  Essa é a questão que temos como sociedade (clientes) de discutir e questionar se for o caso.

A Constituição Brasileira de 1988 prevê os ensinos público e privado, sujeitos a regras definidas e objeto de sistemática avaliação de qualidade. O Censo do ensino superior de 2023 nos mostra que o ensino superior público disponibiliza pouco mais do que 1 milhão de vagas enquanto o privado disponibiliza mais que 23,5 milhões. Enquanto o ensino privado passa por problemas pela alta ociosidade das vagas oferecidas, as instituições públicas sofrem com seguidos contingenciamentos de suas dotações orçamentárias, o que prejudica a qualidade de uma forma geral tanto no ensino, como na pesquisa e na extensão.

Considerando que praticamente 96% das vagas estão no ensino privado e as públicas costumam ter um foco maior na pesquisa, como o foco do artigo é  a preocupação com a formação profissional, cabe focar considerações nele.

O que tem acontecido na gestão dessas organizações?

Grande preocupação principalmente em competitividade e custos, direcionando suas ações para os indicadores de captação e evasão o que leva a redução de mensalidades, diminuição de custos e diminuição de índices de reprovação. Manter qualidade reduzindo custos é tarefa complexa, bem como reduzir reprovações sem aumentar dedicação docente ( gera aumento de custos). A solução passa então a buscar novas metodologias educacionais focadas em diminuir intervenção docente (diminui custos), se utilizar de conteúdos digitais e autoestudo (mais baratos e pretensamente mais bem aceitos pelos alunos, mas que não se dedicam) e criar fórmulas novas de avaliação que facilitem a aprovação.

Que resultados essas ações têm gerado?

Mensalidades cada vez mais baratas, gerando cada vez mais riscos para as instituições e para a qualidade, o que leva a necessidade de mais alunos para manter o ponto de equilíbrio financeiro, resultando em centralização do ensino em grandes grupos, facilidade de aprovação de alunos mais focados no diploma e não no conhecimento, professores desmotivados e prejudicados por  sentirem–se pouco valorizados e por muitas instituições que não cumprem seus compromissos trabalhistas e mercado de trabalho com crescente dificuldade de preenchimento de seus quadros, em função de egressos de baixa qualidade.

Enfim, um Brasil com cada vez mais dificuldades de desenvolvimento, por escassez de profissionais qualificados e com sérios problemas econômicos e sociais.

*Adm. Luiz Cezar Vasques é conselheiro e diretor de Planejamento e Desenvolvimento Institucional do CRA-RJ

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