Kakebo
Um postulado da economia diz que há uma tendência do aumento das necessidades humanas, na medida em que as rendas aumentam. Num outro viés, um ditado propaga que fica rico quem gasta menos, e não quem ganha mais. São inúmeras as teorias econômicas que procuram explicar a relação dos homens com dinheiro e consumo. Mas o inexplicável é a razão do endividamento das pessoas.
O Brasil é o país onde encontramos um dos mais elevados percentuais de pessoas com dívidas. Há uma estimativa de que 78,8% de famílias estão com dívidas, adimplentes ou inadimplentes. Conforme o “Mapa da Inadimplência” do Serasa, em julho de 2024 existiam 72,66 milhões de devedores com nomes negativados. Podemos apontar alguns vilões responsáveis por este triste quadro: facilidade de uso do crédito nas compras, cheque especial, empréstimo consignado, e o maior deles, o cartão de crédito. Tive o desprazer de receber uma negativa quando pleiteei meu primeiro cartão Diners, isto faz muito tempo. Na época eu tinha um emprego de gerente administrativo de uma empresa comercial, e a objeção teve como justificativa a insuficiência de renda. Hoje, qualquer pessoa tem acesso a cartões de crédito. Os serviços de telemarketing das empresas chegam a ser impertinentes ao oferecer o produto.
Numa reportagem da extinta revista Manchete, do dia 29 de outubro de 1966, o icônico economista Roberto Campos (1917 – 2001) confessa desprezar o socialismo utópico, que, segundo ele, “se parece com o macaco bonzinho da lenda asiática que durante uma terrível inundação, subiu célere ao tronco de uma árvore, e, movido por um sentimento de caridade, inclinou-se no galho para tomar em suas mãos um peixe que se debatia cansado, nadando contra a correnteza; e o peixe morreu… Macacos bonzinhos são os que querem curar nossa pobreza incentivando o consumo e não o investimento”, disse ele. De Clésio Guimarães certa forma, o incentivo ao consumo, os modismos e a cultura contribuem substancialmente para o endividamento das pessoas. Basta observar os usuários de aparelhos celulares, que empenham a alma, se necessário for, para terem acesso ao último modelo de um iPhone, ou a compra de mais um par de sapatos, ou de uma nova roupa, e por aí vai.
O hábito de comprar coisas por impulso, sem necessidade imediata, pode ser um sinal de que a pessoa está com um transtorno chamado “oniomania”. Confirma-se o acometimento desse transtorno compulsivo quando não se resiste à pressão da compra, ocasionando endividamento, prejuízo financeiro e um sentimento de culpa.
O problema é antigo, e vem do Japão uma solução para o controle das contas familiares. Em 1904, a jornalista Hani Motoko criou um método para ajudar as esposas a administrarem a economia familiar de forma eficiente, que ficou conhecido como Kakebo, que significa “Livro de Contas Domésticas”. Recentemente, a escritora Fumiko Chiba lançou o livro “Kakebo: A Arte Japonesa de Poupar Dinheiro”, explorando a filosofia por trás do uso desta técnica, com ênfase em coisas que não podem ser dispensadas e aprendendo a se livrar daquelas que não são gastos essenciais. Por esse método, os praticantes são encorajados a criar um diário financeiro e examinar suas despesas com atenção, identificando padrões de gastos dispensáveis e estabelecendo metas realistas, para economizar e investir. Uma dessas metas é utilizar a regra 50- 30-20, onde 50% do ganho mensal são destinados a gastos fixos, 30% para os gastos variáveis e 20% para poupar. É fácil? Claro que não, mas vale a pena tentar!
Encerro com um ensinamento do escritor George Clason (1874 – 1957): “A economia consiste em gastar menos do que você ganha, não importa o quanto você ganha”.