A geração perdida

A crise econômica mundial de 2008 coloca de forma dramática a questão do emprego para os jovens que ascendem ao mercado de trabalho.

Essa dificuldade que antes já se percebia sem muita nitidez, agora se dá explicitamente, à vista de todos.

O presente e o futuro são sombrios, a ponto de já se falar em geração perdida. É claro: os jovens melhor qualificados têm muito menos dificuldade de obtenção do tão almejado emprego. Mas nem sempre para todos. O fenômeno do “over- qualified” tem sido um sério entrave para muitos, por mais incrível que pareça.

A pergunta que se coloca é o quanto a explosão de desemprego dos jovens fragiliza a sociedade mundial contemporânea? A crise produz, de fato, a geração perdida? A precariedade no emprego aprofunda o radicalismo dos jovens na contestação às instituições?

É indiscutível que, nas economias desenvolvidas e mesmo nos países emergentes, o desemprego massivo e a precarização do trabalho atingem contundentemente a juventude de menos de 25 anos, exatamente a que constitui a que muitos preferem chamar de Geração Y.

Ao contrário do maravilhoso porvir tão propalado por muitos analistas em todo o mundo, e equivocadamente ainda reiterado por aqueles que se recusam a ver a realidade, o futuro dessa Geração Y não será um mar de rosas, mas certamente marcado pela exclusão do mercado de trabalho.

O sentimento de rejeição impregnado numa idade em que se está em plena construção de si mesmo, quando se dá os primeiros passos no delineamento do futuro, pode arrastar em muitos jovens uma forte sensação de desestímulo, a perda de confiança nas instituições e o desenvolvimento de atitudes radicalizadas de contestação e de extravasamento das frustrações acumuladas.

O desemprego massivo em parcela tão grande dessa população de jovens nada mais é, no entanto, da parte do iceberg fora d’água. É apenas a parte que aparece. Abaixo da linha d’água, nas profundezas sócio-políticas e econômicas, os jovens são também as vítimas mais sofridas da pobreza e da precariedade do trabalho existente em todo o mundo.

Em países emergentes como o Brasil, o desemprego da população jovem não é normalmente um bom parâmetro para se examinar as condições objetivas da realidade.

A ausência de estatísticas confiáveis e, sobretudo, porque muitos jovens participam da economia informal em atividades lícitas e ilícitas, falseia-se a adequada compreensão do quadro de circunstâncias em que vive a maior parcela dos integrantes da chamada Geração Y.

Em verdade, em países como o nosso, muitos jovens permitem-se não trabalhar por serem sustentados por seus pais ou por avós, aposentados ou pensionistas. Você se não tem um caso desses em sua própria família, certamente convive com situações próximas em seus círculos de relações.

Quando se analisa um conjunto expressivo de países, os dados da OIT/Organização Internacional do Trabalho são alarmantes: os jovens pobres que ainda conseguem trabalhar tendem a ocupar empregos precários, em que realizam longas jornadas de trabalho, com baixa produtividade, salários ínfimos, e frágil proteção social, esta quando existente.

O que está em debate, portanto, não é somente a oferta de emprego, mas igualmente a sua qualidade.

O malogro do acesso ao mercado de trabalho é difícil de superar e pode expor os jovens sem emprego à estigmatização permanente.

A geração atual, a tão propalada Geração Y, está a sofrer as conseqüências de uma má largada na trajetória da vida, bem ao contrário dos “sonhos de uma noite de verão”, prenhe de privilégios e facilidades previstos pelos profetas acadêmicos e jornalistas em diferentes mídias e compêndios.

É bem possível até que muitos venham desistir, entregar-se a um mau futuro, e, assim, tornar-se-ão invisíveis e anônimos, fora dos registros e das estatísticas oficiais de emprego e de colocação profissional.

Para o restante, é claro, a crise tende a reduzir salários e a precarizar ainda mais as condições de trabalho.

Possivelmente, os jovens vitimados pela atual crise global sofrerão ainda mais na retomada da plenitude da atividade econômica e na conseqüente criação de empregos. As empresas serão muito reticentes em lhes empregar, optando pelos novos quadros diplomados no após-crise. A busca da produtividade máxima as levará à contratação das competências mais imediatas oferecidas pelos recém-saídos dos bancos escolares, pressupostamente com melhor formação contextualizada aos requisitos dos novos tempos.

A massa de deserdados, a geração perdida, poderá assim representar um grave risco político para a preservação das instituições democráticas em todo o mundo.

Esses jovens sentem-se vítimas dos distintos sistemas da sociedade de mercado. Extravasam a sua frustração e angústias sobre aqueles que lhes parecem ser os primeiros responsáveis: a globalização, os políticos, as elites da sociedade, a corrupção dos governos, os seus próprios pais e, principalmente, um grupo étnico específico.

Tornam-se assim sensíveis ao discurso religioso revolucionário, sucedâneo moderno das ideologias políticas radicalizadas que permearam todo o Século XX. Só aí localizam a possibilidade de excitação a uma nova esperança – certamente falsa – de construção de um futuro distinto do presente que têm tido.

Longe de pretender estigmatizar toda uma geração, a sociedade mundial contemporânea defronta-se com um fantástico desafio: com abrir o acesso dos jovens ao emprego e à empregabilidade?

O custo da ociosidade e da exclusão ocupacional de tão grande parcela de uma geração será considerável. A equação é simples: os Estados ressentem-se cada vez mais de contribuição aos regimes de seguridade social. A solidariedade entre gerações é imprescindível para o equilíbrio dos sistemas de pesos e contrapesos de sustentação da proteção social. A ausência de contribuição de tanta gente agravará ainda mais o desequilíbrio no futuro.

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