Administração e o bem geral: 60 anos de contribuições à sociedade

As comemorações dos marcos profissionais cumprem papel vital não apenas para fortalecer a identidade de seus integrantes, mas também para evidenciar as contribuições que essas categorias oferecem à sociedade.

A celebração do Jubileu de Diamante dos 60 anos da regulamentação da profissão de Administrador, realizada no último 17 de setembro na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, junto ao Conselho Regional de Administração (CRA-RJ), ao homenagear um grupo de profissionais que se destacam na construção e execução de políticas e estratégias de interesse público, insere-se nesse contexto. E mais do que isso: trata-se de uma oportunidade singular para refletir sobre o papel da Administração na construção de um país melhor.

O aniversário de 60 anos da profissão remete às suas raízes técnico‑acadêmicas. O ensaio The Study of Administration, de Woodrow Wilson (1887), lançou as bases da identidade disciplinar da Administração Pública como campo de conhecimento, ainda que artificialmente separando-a da política – dicotomia que foi mais adiante criticada.

Posteriormente, o foco na eficiência industrial, defendido por Frederick Taylor, Henri Fayol e Alexei Stakhanov, foi complementado por Herbert Simon, Nobel de Economia de 1978, que destacou a importância dos processos decisórios para o desafio teleológico maior na promoção da eficácia na obtenção de metas, objetivos e resultados.

E assim, a Administração foi se consolidando como um campo interdisciplinar, incorporando contribuições da Estatística, Sociologia, Antropologia, Psicologia, Economia, Direito e da Informática, orientadas para as dinâmicas sistêmicas, organizacionais e interorganizacionais, em variados contextos institucionais, públicos e privados.

No campo da aplicação do conhecimento no Brasil, é na Era Vargas que a Administração ganha seu perfil profissional. Sob a direção de Luiz Simões Lopes, o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) formatou as bases da departamentalização ministerial e dos processos do orçamento, da contabilidade pública, da administração financeira, das compras e da gestão dos recursos humanos, modernizando a gestão do Estado.

Em 1944, também sob a liderança de Luiz Simões Lopes, foi criada a Fundação Getulio Vargas, onde nasceram a Escola Brasileira de Administração Pública (1952), sob os auspícios da ONU, e a Escola de Administração de Empresas de São Paulo (1954). Desde então, as bases acadêmicas de formação e especialização de nossos administradores avançou enormemente, com um crescimento exponencial de escolas e departamentos universitários por todo o país, tornando a Administração em um dos cursos com mais matrículas do ensino superior brasileiro.

Uma vez institucionalizada a busca da boa gestão como política de estado para o exercício legítimo do poder, costurou-se habilmente a relação imprescindível entre formação avançada e profissionalização. Este contexto profícuo deu lugar a regulamentação, em 9 de setembro de 1965, inspirada por Belmiro Siqueira, patrono da profissão, cujo nome batiza o prêmio que celebra a excelência técnica e ética dos administradores, e Alberto Guerreiro Ramos, intelectual rigoroso e polêmico que ensinou pensar a Administração desde o Brasil, com método, sentido histórico, responsabilidade social e compromisso pragmático com a realidade nacional.

Com eles aprendeu-se que técnica sem propósito é vazia e propósito sem técnica é ineficaz.

A Administração está presente em todas as dimensões da vida social. É a ponte entre o desejo político, econômico e social e a entrega concreta, reproduzindo-se em diferentes níveis hierárquicos e especialidades, unida por uma gramática comum de planejamento, execução, avaliação e aprendizagem contínua. Em cada avanço da sociedade brasileira — do desenvolvimento econômico aos programas sociais; nas políticas setoriais, tais como as de saúde, educação, inclusão, meio ambiente, tecnologia, inovação e defesa nacional, entre tantas outras; da inovação privada à governança do terceiro setor — observa-se a imprescindível contribuição silenciosa e persistente de administradoras e administradores, tradutores de propósitos em resultados, recursos escassos em valor público e conflitos legítimos em soluções sustentáveis.

Com isso, milhares de médicos, engenheiros, economistas, advogados, contadores e militares, entre outros, inevitavelmente complementam seus estudos para desenvolverem valores, atitudes, comportamentos e habilidades técnicas em Administração.

Celebrar os 60 anos da regulamentação da profissão é renovar compromissos. Em especial aos princípios constitucionais de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência; ao conhecimento fundamentado em evidências; e, sobretudo, com a destinatária final da Administração: a sociedade.

Retomando Guerreiro Ramos: não há gestão neutra. Toda decisão carrega valores. Que a ação administrativa continue refletindo, cada vez mais, a ética do serviço, a coragem da inovação e a construção de um Brasil mais democrático, eficiente e eficaz, justo e sustentável.

*Adm. Bianor Scelza Cavalcanti é professor na Fundação Getúlio Vargas

 

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