Diversidade e gestão racial de pretos e pardos no ambiente corporativo: desafios e perspectivas

1. Introdução

Este artigo discute a importância da gestão da diversidade racial, com foco na inclusão de pessoas pretas e pardas no mercado de trabalho. Fundamentado em teorias sobre diversidade organizacional, justiça social e igualdade de oportunidades, o texto explora os desafios enfrentados pelas empresas para promover a equidade racial e as práticas de gestão que podem alterar mudanças significativas.

A diversidade racial tem ganhado destaque no debate sobre inclusão e responsabilidade social corporativa. No Brasil, onde a maioria da população é composta por pessoas pretas e pardas (IBGE, 2022), os índices de desigualdade racial persistem em diversos setores econômicos. Este artigo busca analisar a gestão racial como um componente estratégico para organizações comprometidas com a equidade e a inovação. A gestão da diversidade tem se consolidado como um dos principais pilares das práticas organizacionais modernas, especialmente em um contexto globalizado e socialmente desigual. No Brasil, a pauta da diversidade racial é de fundamental importância, considerando que a maior parte da população é composta por pessoas pretas e pardas (IBGE, 2022), mas que, paradoxalmente, continuam sub representadas nos cargos de liderança e em setores estratégicos do mercado de trabalho.

Essa discrepância evidencia não apenas desigualdades históricas e estruturais, mas também limitações intrínsecas às práticas organizacionais. Enquanto muitas empresas adotam discursos sobre inclusão, observa-se que a implementação de políticas efetivas enfrenta barreiras culturais, institucionais e, até mesmo, econômicas, criando um ambiente onde a equidade racial permanece como um desafio em construção (Almeida, 2019).

Sob essa perspectiva, este artigo tem como objetivo explorar os limites e desafios da gestão racial externa para a inclusão de pessoas pretas e pardas no ambiente corporativo, com base em teorias da justiça social, gestão da diversidade e racismo estrutural. Também serão apresentadas as restrições enfrentadas por organizações ao tentar conciliar interesses econômicos com demandas sociais e éticas, destacando o papel das políticas afirmativas e das iniciativas educacionais como instrumentos de transformação.

Ao final, buscamos compreender como as empresas podem superar essas barreiras, indo além de abordagens superficiais e avançando para estratégias que promovam mudanças estruturais e rigorosas. Para isso, são adotados referenciais teóricos de autores como Rawls (1971), Thomas (1990) e Almeida (2019), além de dados empíricos que reforçam a urgência de compensar as práticas de inclusão racial no Brasil.

 2.1. Diversidade e Gestão Racial: Conceitos e Contexto

A diversidade racial no ambiente corporativo é um tema que transcende a discussão ética e social, posicionando-se como uma estratégia de competitividade organizacional. Segundo Thomas (1990), a gestão da diversidade envolve respeito, respeito e valorização das diferenças individuais em prol de um ambiente mais inclusivo e inovador. Contudo, no Brasil, o racismo estrutural — definido por Almeida (2019) como um sistema que perpetua desigualdades raciais de forma institucionalizada — cria barreiras significativas para a inclusão de pessoas pretas e pardas.

Apesar de constituírem a maioria da população, as pessoas negras enfrentam um cenário de exclusão no mercado de trabalho, especialmente em cargas de liderança. Dados do IBGE (2022) mostram que a representatividade negra em cargos gerenciais é inferior a 30%, estabelecendo uma lacuna expressiva entre discurso e prática no que tange à equidade racial.

2.2. Desafios e Restrições na Gestão da Diversidade Racial

Um dos principais desafios na implementação de políticas de inclusão racial é a resistência organizacional, que pode se manifestar de forma explícita ou velada. Segundo Santos (2020), muitas empresas ainda perpetuam uma cultura dinâmica, onde a “meritocracia” é utilizada como argumento para evitar ações afirmativas. Esse discurso ignora as desigualdades de ponto de partida enfrentadas por pessoas pretas e pardas, perpetuando ciclos de exclusão.

Embora políticas afirmativas, como cotas e programas de diversidade, tenham ganhado espaço no Brasil, sua eficácia muitas vezes é limitada pela falta de planejamento e monitoramento adequado. Carvalho et al. (2022) destacam que essas iniciativas, quando não integradas à estratégia organizacional, tendem a ser vistas como ações pontuais, sem impacto significativo no longo prazo.

O racismo estrutural, conforme Almeida (2019), também atua como um fator limitante, dificultando a ascensão de pessoas negras em ambientes corporativos. A normalização de práticas discriminatórias, como processos de seleção invejados e redes de networking excludentes, reforçam a desigualdade racial, mesmo em empresas que adotam discursos de inclusão.

De acordo com Thomas (1990), diversidade organizacional refere-se à valorização das diferenças individuais, como raça, gênero, etnia e orientação sexual, no ambiente de trabalho. A diversidade não apenas promove a inclusão, mas também gera vantagens competitivas, como maior criatividade e inovação (Robinson & Dechant, 1997). Rawls (1971), em sua teoria da justiça, argumenta que as desigualdades são aceitáveis ​​apenas se beneficiam dos menos favorecidos. Aplicada ao contexto organizacional, esta teoria enfatiza a necessidade de políticas afirmativas para corrigir desigualdades históricas enfrentadas por pessoas pretas e pardas.

2.3. Representatividade Racial no Mercado de Trabalho

Estudos como os de Nogueira e Araújo (2019) destacam a sub-representação de pessoas negras em cargas de liderança. Essa realidade reflete o racismo estrutural, definido por Almeida (2019) como a normalização de práticas que perpetuam a exclusão racial. A falta de consciência racial nas organizações é uma das principais barreiras para a inclusão.

Conforme Santos (2020), o preconceito velado e a falta de oportunidades para pessoas negras são evidências de um sistema organizacional que precisa ser transformado. Embora ações afirmativas sejam fundamentais para a equidade, elas frequentemente enfrentam resistência dentro das organizações. Segundo Silva (2021), é necessário um esforço educacional para desmistificar a ideia de que essas políticas são injustas.

  1. Boas Práticas em Gestão da Diversidade Racial

A promoção da diversidade racial no ambiente corporativo exige ações estratégicas que vão além do discurso e se traduzem em práticas concretas, alinhadas às demandas da sociedade e às exigências de um mercado cada vez mais diverso. Processos seletivos inclusivos são fundamentais para ampliar a representatividade racial nas organizações. Remoção de informações como nome e endereço nos currículos, focando nas competências e experiências dos candidatos, obviamente viés inconscientes (Carvalho et al., 2022). Estabelecer parcerias com organizações distintas para o desenvolvimento profissional de pessoas negras, como o Instituto Identidades do Brasil.

Educar lideranças e colaboradores sobre racismo estrutural, visões inconscientes e a importância da inclusão é essencial para criar um ambiente de trabalho mais justo. Empresas como a Natura realizam treinamentos periódicos para conscientizar seus funcionários sobre questões raciais e a importância de práticas inclusivas (Gomes, 2020). Atividades práticas que simulam situações de exclusão ou desigualdade ajudam os participantes a compreender o impacto do racismo no dia a dia corporativo. Empresas como o Magazine Luiza implementaram programas de trainees exclusivamente voltados para pessoas negras, promovendo a inclusão em cargas estratégicas (Oliveira & Santos, 2023).

A criação de grupos de cobertura é uma prática eficiente para fortalecer vínculos e dar voz aos colaboradores de grupos subrepresentados. Esses grupos promovem apoio mútuo, aumentam o engajamento e ajudam a identificar barreiras organizacionais. Organizações como o Google e a IBM possuem redes internas externas para colaboradores negros, que oferecem espaços de troca de experiências e suporte emocional. Programas de mentoria específicos para pessoas negras ajudam a preparar colaboradores para assumir cargas de maior responsabilidade, promovendo ascensão profissional (Santos, 2020).

O compromisso com a diversidade racial deve ser tangibilizado por meio de metas claras e da medição contínua dos resultados.  Empresas líderes no tema, como Microsoft e Unilever, publicam relatórios anuais detalhando as ações realizadas e os resultados alcançados. Definição de objetivos mensuráveis ​​para a inclusão racial em diferentes níveis hierárquicos ajuda a orientar as ações organizacionais e a avaliar seu impacto (Silva, 2021).

A valorização da cultura negra nas organizações é uma forma de celebrar a diversidade e fortalecer o senso de pertencimento. Promover eventos internos em dados como o Dia da Consciência Negra (20 de novembro) ajuda a reforçar o compromisso com a inclusão. Patrocinar projetos culturais relacionados à valorização da cultura afro-brasileira, como exposições e palestras, demonstrar alinhamento com causas sociais.

 Considerações Finais

A gestão da diversidade racial no Brasil, especialmente voltada para a inclusão de pessoas pretas e pardas, representa tanto um desafio quanto uma oportunidade para organizações que buscam se apegar a valores éticos e à demanda por inovação. Embora avanços tenham sido registrados, como o aumento de políticas afirmativas e a valorização do tema em discursos corporativos, persistem barreiras estruturais e culturais que limitam o impacto dessas iniciativas.

Entre os principais desafios identificados, destacam-se o racismo estrutural, a resistência interna às mudanças e a falta de considerações claras para avaliar os resultados das práticas de inclusão. Nesse sentido, torna-se evidente que a gestão da diversidade racial exige uma abordagem integrada, que combine políticas afirmativas, sensibilização educacional e ações voltadas para a promoção de equidade em todos os níveis hierárquicos.

As boas práticas apresentadas neste artigo, como programas de recrutamento inclusivos, grupos de camada e treinamentos antirracistas, demonstram que é possível transformar a cultura organizacional e promover um ambiente de trabalho mais justo e diverso. No entanto, essas ações terão impacto duradouro se forem acompanhadas por um compromisso genuíno de lideranças e por estratégias alinhadas aos objetivos de longo prazo da organização.

Ao avançar nessas situações, futuros estudos poderão não apenas enriquecer o campo teórico sobre diversidade e gestão racial, mas também oferecer recomendações práticas para empresas e gestores específicos na transformação de seus ambientes organizacionais. Além disso, contribuirão para o fortalecimento de uma agenda de pesquisa que valorize a inclusão e promova uma sociedade mais equitativa.

Por fim, reforçar-se que a inclusão racial não é apenas uma questão de justiça social, mas também um fator estratégico para as organizações que desejam se destacar em um mercado globalizado. A valorização de talentos diversos não só amplia a criatividade e a inovação, como também contribui para a construção de uma sociedade mais equitativa e inclusiva. Assim, a gestão da diversidade racial deve ser encarada como uma prioridade ética e estratégica, capaz de gerar benefícios para indivíduos, empresas e a sociedade como um todo.

Referências Bibliográficas

Almeida, S. (2019). Racismo estrutural . São Paulo: Pólen.

Carvalho, E., Santos, F., & Oliveira, R. (2022). Práticas de diversidade nas organizações brasileiras. Revista de Gestão e Negócios. 19(3), 45-60.

IBGE (2022). Censo Demográfico 2022 . Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Nogueira, M., & Araújo, T. (2019). Inclusão racial no mercado de trabalho: desafios e avanços. Revista Brasileira de Administração, 76(4), 89-102.

Rawls, J. (1971). Uma teoria da justiça. Harvard University Press.

Santos, J. (2020). Racismo velado no ambiente corporativo. Revista de Estudos Organizacionais , 8(2), 100-118.

Silva, L. (2021). Políticas afirmativas: impacto e percepção organizacional. Gestão & Sociedade , 15(2), 55-70.

*Adm. Ricardo Nascimento Ferreira é membro da Comissão Especial do Trabalho e Empregabilidade do CRA-RJ, Professor Universitário e Consultor.

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