Síndrome do retrovisor
Um acessório imprescindível em um veículo é o retrovisor. Sua função é mostrar o que ficou para trás, para nos orientar na tomada de decisão diante do que pode vir pela frente. O filósofo e poeta dinamarquês Soren Kierkegaard (1813 – 1855) dizia que: “A vida somente pode ser compreendida olhando para trás, mas somente pode ser vivida olhando para a frente”. Embora nada pode ser feito para mudar o passado, podemos tê- -lo como o melhor dos mestres, pois nos ensina a não cometer os mesmos erros. Seria tão bom se nossa trajetória de vida fosse escrita em um caderno, semelhante ao que acontece na escola, quando, ao cometermos um erro, aplica-se uma borracha e apaga tudo para novamente reescrever. Como isso não é possível, resta-nos aprender com os erros e passar a fazer a coisa certa. Diferentemente do passado, que é feito de experiências reais, o futuro é constituído por sonhos e projetos. Confúcio (551 a.C. – 479 a.C.) deixou o seguinte pensamento: “Se queres prever o futuro, estuda o passado”. Por semelhante linha, a Bíblia também nos orienta com relação aos ensinamentos das experiências passadas, conforme registrado no livro das Lamentações do profeta Jeremias (12:16) com o seguinte texto: “Quero trazer à memória o que me pode dar esperança”. O que o profeta quis dizer é que o que fica na nossa lembrança é o que nos motiva a enfrentar os desafios do presente e do futuro. Algumas correntes filosóficas criticam a prática de relembrar o passado com o argumento de que isto é sofrer duas vezes. Não tem consistência essa tese, uma vez que, mesmo que erros tenham sido cometidos, sempre fica o aprendizado, dando origem à expressão: “aprender com os erros”. No ambiente corporativo, o histórico de uma empresa é uma importante referência na confecção do seu perfil diante da construção da sua credibilidade. Na obtenção de crédito junto às Clésio Guimarães instituições financeiras, ao ser elaborado o “rating” (mapa de riscos), um dado imprescindível é o tempo de existência e sua história. Quando falamos dos indivíduos, conta muito suas ações que ficaram para trás. É comum ouvirmos pessoas dizerem: “meu passado me condena”, ou num outro contexto, “meu passado me habilita”, em se tratando de uma pessoa com ilibada reputação. Um termo usual na busca do entendimento do passado, a herança cultural, é o patrimônio histórico que recebemos de nossos antepassados, representando uma fonte rica de conhecimentos, ligando gerações e proporcionando um entendimento mais profundo das raízes de uma família ou comunidade. Sem memória, hoje nossa civilização caminha desnorteada, pois não conhece seu passado, não tem consciência em seu presente e não projeta perspectiva para o futuro. Apesar de não haver unanimidade, a exaltação de vultos que fizeram a história, através da divulgação de suas biografias, deveria ser obrigação das autoridades, como em muitos casos o é. Algumas cidades, como Niterói, nas placas de identificação de ruas, fazem constar informações a respeito da personalidade que deu nome ao logradouro. Isto é olhar para trás. Quando estive como Secretário de Fazenda de Cabo Frio, tive o prazer de participar de um projeto denominado “Memória Fazendária”, tendo à frente a Prof.ª Margareth Rodrigues, onde, através dos livros de registros fiscais, resgatamos a história do município sob a ótica do fisco. Tal projeto foi apresentado num simpósio na Biblioteca Nacional, premiado com uma publicação no anuário daquela instituição, em 2012. Encerro com uma citação do poeta espanhol George Santayana (1863 – 1952): “Aqueles que não conseguem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”.